Aos meus parceirões de cadeia.

Meu pai me chamou num cantinho, pra visita ilustre não notar. Falou: “vai na casa da sua tia, e pede a ela um pouquinho de café, mesmo de de manhã, para oferecermos ao pastor que está aqui.” Voltei já com um pequeno bule frio na mão, buscando cuidado moral no esconder nossa miséria. Mas não teve jeito, o mestre de Deus viu quando meus pés descalços, tentando discrição, chegaram retraídos com a bebida emprestada. Este emprestada, no modo de disfarçar de nós mesmos, num abrandamento falso mas aliviador, a penúria da nossa miséria.

Preso já na cadeia, no caso uma penitenciária, para amenizar e nos manter em comunhão contávamos casos. De ataques a defesas, a histórias ouvidas ou vividas por nossos morros da vida. Numa correria de polícia já feridos tínhamos que nos esconder. O lugar seguro só o momento é que dizia. O tudo era não rodar. E então cada um no seu instante. Podia ser e acontecia, de uma mais tragédia nos gritar em nossa cara. No barraco do acoite não tinha comida. A geladeira vazia. Sem dinheiro por ali nem tinha como o alimento chegar. Pelos cômodos e panelas a ausência de carnes grassava feito garrote. Eles não tinham o que comer. Ferido e no terror eu ia aos poucos me acalmando; até mandar um recado aos meus amigos do crime, que trouxessem um pouco de supermercado. A família faminta não podia padecer, nem morrer.

O pastor só nos trazia Deus, e nadinha ao nosso estômago vazio. Muitos do morro desejam ardentes uma visita inusitada do crime. Um bandido a se esconder que vai lhes prover comida. E este, o bandido, pode ser que esteja preenchendo seu coração da comida que lhe faltou na infância; e que agora só no crime ele consegue ofertar a alguém.

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